O Brasil é conhecido como o país da meia entrada: é meia entrada no cinema, no teatro, no show, no ônibus — em tudo o que um político possa usar para fazer média com algum grupo.
O princípio da meia entrada parece, à primeira vista, virtuoso. Quem propõe acredita que está oferecendo um benefício; quem recebe, sente que ganhou um subsídio. Mas o que ambos ignoram é a verdade econômica básica: não existe almoço grátis. Custo é custo — e se alguém paga menos, é porque outro está pagando mais para compensar.
Na reforma tributária, esse mesmo raciocínio está escancarado. Vários setores que hoje gozam de uma carga tributária reduzida — a famosa “meia entrada” fiscal — lutam para manter seus privilégios, sem se dar conta do impacto que isso tem sobre a competitividade do país como um todo.
Não existe “meia entrada” no sistema tributário. O que há são distorções artificiais. Nas audiências públicas da reforma, setores que pagam entre 3% e 20% de impostos se revezam para justificar por que deveriam continuar com uma carga de apenas 3%. Vamos ser francos: quem paga 3% não está com meia entrada, está com entrada franca!
O problema é aritmético. Para que o Estado arrecade o que precisa, se um setor paga 3%, outro terá que pagar 55% ou mais. Claro que devemos considerar a média ponderada — a carga tributária multiplicada pelo volume de operações de cada setor —, mas o ponto é que essas distorções geram ineficiência econômica e aumentam o chamado “Custo Brasil”.
O efeito da meia entrada tributária é perverso: desorganiza o sistema, penaliza setores produtivos, e afeta especialmente aqueles que competem globalmente. A indústria de transformação brasileira é um exemplo clássico. Perde competitividade, encolhe, e se vê forçada a buscar refúgio em regimes fiscais especiais, como a Zona Franca de Manaus. Não por acaso, setores como linha branca, motos e eletroeletrônicos migraram para lá.
Mas será que a saída é transformar todo o Brasil em uma grande Zona Franca? Pedir “meia entrada” para todos? Ironicamente, isso significaria que todos pagariam metade de um custo que virou o dobro — uma grande ilusão. Uma bobagem cara.
Se legisladores e lobistas compreendessem a ineficiência dos tratamentos diferenciados, o Brasil poderia reduzir sua carga tributária global e aumentar sua competitividade. Eliminar as distorções que alimentam o “custo Brasil” beneficiaria a economia como um todo. A reforma tributária é uma oportunidade para abandonar a lógica da meia-entrada e construir um sistema mais justo, simples e eficiente, onde todos paguem sua parte — sem privilégios e sem truques.